Finalmente um carrinho vazio passou, e Lucien fez sinal. O apartamento do namorado não ficava muito longe dali, mas também não era uma de suas pretensões chegar la enxarcada e com frio. Olhou o relogio. Eram quase três horas, certamente ele estava em casa.
Entrou no carro e explicou o destino ao motorista. Encostou no banco de couro cansada, e com medo. Pensou na reação de Lucca. Não conseguia imagina-la. Talvez ele sorrisse, talvez ficasse com medo, sem reação. Era, realmente, imprevisivel.
Ao menos ele trabalhava, tinha sua propria casa. Era completamente independente. Isso servia de consolo, mas não mudava muita coisa. Lucca morava sozinho desde os dezessete anos, e agora com vinte e três, tinha uma vida quase ajeitada. Dava aulas de musica em duas escolas particulares e fazia faculdade de matematica pela manhã, e com isso ganhava razoavelmente bem. O casal ja viajara para fora do pais e para varios destinos que ambos gostavam muito. Tinham um namoro muito saudavel. Se respeitavam, se aconselhavam.
Lucca era um rapaz atraente, mas nada absolutamente perfeito. Era moreno, com olhos amendoados e bonitos. Tinha cabelos levemente ondulados e era alto, bem alto, contrastando com Lucien, que era bem pequena.
No banco de tras do taxi, Lucien pensou na reação de sua mãe. Ficaria chateada no inicio, com certeza, mas a apoiaria. Era uma mãe muito compreensiva, e com quem os filhos sempre puderam contar. Esse era o problema: não queria desaponta-la.
O taxi parou, o homem gordo com uma barbixa mal feita agradeceu, recebeu o dinheiro e partiu. Lucien ficou na frente de um grande edificio residencial de uma rua pouco movimentada. A entrada do prédio era bonita, tinha muito verdes e algumas flores. Enquanto subia a escada de marmore que dava em um grande portão preto, Lucien reparou que havia também uma casinha de passarinhos azul, e um passaro filhote com a cabeça para fora.
O porteiro abriu a porta, sorriu e cumprimentou a garota. Era um senhor de sessenta e poucos anos, com os cabelos quase todos brancos, e seu uniforme azul. Sempre tratara muito cordialmente as pessoas, e era uma boa compania para uma conversa fiada. Trabalhava ali ha anos, desde que Lucien começara a frequentar o prédio.
Lucca morava no sétimo andar. Era um apartamento de tamanho razoavel, muito bem decorado, mas barulhento. Lucien apertou o botão correspondente e encostou-se na parede do elevador, sua cabeça girando e seus pensamentos a mil. Não sabia como dar a noticia, se sentia nervosa demais para admitir. Mas tudo estava bem, sabia que teria todo o apoio do namorado.
O elevador chegou, e ela abriu a bolsa para tirar a chave que Lucca esquecera. Estava velha e não tinha chaveiro. Esperava lembrar-se de devolve-la dessa vez.
Colocou a chave na fechadura, girou e abriu. A maçaneta estava fria. Trancou a porta e seguiu para o quarto do namorado. Ao que tudo indicava, ele estava dormindo. Geralmente o fazia às terças-feiras, o unico dia que não dava aulas. Aproveitava para descansar e preparar as aulas para o resto da semana.
Lucien entrou.
Sentiu a garganta apertar e os olhos marejarem, ao mesmo tempo que uma onda de enjôo a fez tremer. Não queria acreditar no que via.
°°°°
Havia uma bela garota deitada na cama, abraçada a Lucca. Dormiam profundamente, cobertos por um lençol. Era visivel que estavam nus. Pelo chão, via-se roupas jogadas e pacotes de preservativos abertos. A bolsa da tal morena estava caida no chão, e Lucien sentiu forte impulso de chuta-la para longe. Mas se controlou, e tentou fazer o minimo de barulho possivel enquanto tirava do bolso o papel que imprimira em casa. Pensou em ir embora dali correndo, e esquecê-lo de uma vez, mas ele tinha que saber. Iria deixar o papel na mesa e sair, como se nunca tivesse estado ali.
Mas fez barulho ao desamassar o papel e Lucca acordou, assim como a garota morena que estava em seus braços.
Lucien sentia apenas nojo, e não queria falar. Fuzilou Lucca com os olhos, pensando como aquele homem que a pouco tempo era o amor de sua vida poderia ser tão nojento e ter feito coisa tão absurda com ela. Sentia-se traida, quebrada por dentro. Mas não era um ser repugnante daqueles que a iria deixar abalada. Tinha outras coisas mais importantes agora.
-Amor... Eu, eu posso explicar, espera um segun-começou Lucca, mas Lucien interrompeu.
-Jogue no lixo teus segundos, cara. E não chega perto de mim! - exclamou, quando ele levantou para segura-la e não deixa-la sair. Ele estava com uma bermuda. A outra garota olhava tudo sem entender, e tentava se cobrir com o lençol - Eu tenho nojo de você, muito nojo.
-Amor, deixa eu te explicar, você tem que me escutar - Lucca estava desesperado. Via na namorada o a raiva e não sabia o que fazer para se desculpar.
-Que se dane. Não quero saber. Continue dormindo com ela, provavelmente estava melhor antes de eu chegar. E, a proposito, felicidades papai - disse, jogando em cima de Lucca o papel que tinha nas mãos.
O garoto passou os olhos no papel, e olhou para Lucien sem acreditar. Sempre quisera um filho, e sempre sonhou que fosse de Lucien. Não esperavam uma crianaça agora, mas ela seria muito bem-vinda.
-Amor... eu, eu não acredito ! - Lucca tentou abraça-la, mas ela se afastou e saiu andando em direção à saida, lançando um olhar de profundo nojo à garota enrolada no lençol.
Não queria mais saber, aquela criança não saberia que tinha um pai. Não um tão nojento e repugnante quando Lucca. Ele, por sua vez, correu atras de Lucien para falar com ela, saber o que fazer. Estava ainda mais perdido.
-Não, essa criança não vai ser criada por você. Você é podre, eu quero que você suma da minha vida! Eu não tô acreditando no que você fez, é muita mesquinharia da tua parte. Mas que se dane, quer saber? Não ligo, de verdade. Agora vou la, tenho que fazer um pré-natal e comprar algumas roupas de bebê. E quando preencherem a ficha, vou dizer que essa criança não tem pai! - gritou. Sabia que estava nervosa demais, mas não poderia jamais perdoar o que acontecera.
-Amor, eu vou te ligar quando você estiver mais calma e nos pudermos conversar. Eu te amo muito, e nosso filho vai ser muito amado também - ele tremia, com medo do que poderia ser dali em diante.
Lucien não poderia responder. Sentia os olhos novamente marejados, e começou a ficar tonta. Não conseguia entender o que estava acontecendo, seu cérebro parecia querer recusar. Era dificil demais para ela, nesse estado, ver o pai de seu filho na cama com outra. Era deploravel.
Saiu do apartamento sel dizer mais nada. Entrou no elevador e apertou o botão do térreo.
Não conseguia parar de chorar.
°°°°°
Lucien saiu do elevador tremendo, com os olhos vermelhos e o coração apertado. Não sabia o que faria dali em diante, tinha medo, medo de ficar sozinha com um filho para criar. Medo de não conseguir suportar a barra pela qual passaria. Mas tentava mais do que tudo ser forte. Teria que ser o mais forte que pudesse agora.
Passou a mão pela barriga. Não se via nada ainda, estava com apenas três semanas de gravidez. Mas acalmou-se apenas acariciando o bebê que cresceria ali. Acariciando seu filho, filho de um pai mentiroso. Mas seu filho.
A chuva parara, e Lucien saiu do edificio sem dar adeus ao porteiro, que a olhava de longe como se ja soubesse de tudo. Ela não o culpava, mas nao deixava de sentir raiva quando pensou que ele poderia tê-la avisado, ao menos. Ela talvez não tivesse que passar pela vergonha de olhar na cara dele. Mas isso agora era passado, e ela tinha muito com o que se preocupar enquanto uma vida crescia ali.
Andou alguns quarteirões, sem pensar muito bem onde estava indo, e passou na frente de um centro médico de ultrassonografia. Entrou. Precisava marcar uma, para ver se tudo estava bem e se acostumar com essa nova fase de mamãe.
Era uma clinica enorme, especializada em ultrassonografia de Gravidez, arejada e muito bem decorada. As pessoas andavam depressa ali dentro, e Lucien viu duas gravidas lendo uma revista. Não pode deixar de sorrir ao ver o barrigão de uma delas. Era uma mulher jovem e morena, usava uma bata e mostrava o ventre com satisfação. Lucien não podia esperar para ter uma barriga para mostrar. Mostrar que era forte. Que aguentaria isso e seria muito feliz com seu filho, ou filha.
A atendente a chamou. Sorria calorosamente.
-Bom dia, em que posso ajuda-la?
-Bom dia - Lucien começou - Eu gostaria de marcar uma ultrassonografia. - Terminou, com um sorriso.
-Claro. Sua primeira?
-Sim.
-Esta com quantas semanas de gestação?
-Três - Lucien sorriu confiante.
-A ultrassonografia sera acompanhada?
-Ahn.... - Lucin hesitou. Acompanhada por quem? Pelo pai? Não, ele era troglodita demais para isso - não. Desacompanhada.
-Tudo bem. Os horarios estão quase todos lotados, mas daqui a três dias poderemos atendê-la, às dezesseis horas.
-Otimo, quinta-feira as dezesseis horas. Estarei aqui.
-Forma de pagamento?
-Dinheiro.
-Otimo. A ultrassonografia simples, a que as gestantes fazem nos primeiros meses de gravidez, custa cento e trinta e dois euros.
-Otimo - Lucien começou a pensar seriamente o quanto custava caro ter um filho - Posso pagar no dia?
-Claro.
-Então ta, muito obrigada.
-Eu que lhe agradeço. Quinta-feira, as dezesseis horas estaremos prontos para atendê-la.
-Obrigada, até logo.
Saiu da clinica escandalizada com o preço da ultrassonografia, mas mesmo assim feliz por poder fazê-la logo. Não pediria um centavo ao pai da criança. Sabia que ele estava no direito de acompanhar a gestação, que era seu dever ajudar nas despesas, mas ela não tinha a minima vontade de manter contato com ele agora. Talvez depois, quando estivesse mais calma. Mas agora, tudo que passava na sua cabeça era ela e a criança. Não queria pensar em Lucca.
Lucien trabalhava desde os dezesseis anos por escolha propria. Nunca precisara, a familia tinha boas condições. Moravam em uma casa grande num bairro nobre. Mas, de qualquer maneira, nunca gostara de pedir dinheiro à mãe, então começou a trabalhar cedo para ficar independente cedo. Ganhava um dinheiro legal dando aulas particulares de inglês. Sabia que so com aquilo, ela e o filho talvez passassem necessidade, mas conseguiriam se virar.
Tinha algum dinheiro guardado, e continuaria trabalhando até que nã pudesse mais. Respirou profundamente, mais tranquila. Tudo iria se ajeitar, tudo daria certo no final.
Longe dali, uma sirene começou a tocar alto e constante, apavorando homens e mulheres em questão de segundos. Uma sirene maldita, que todos esperavam que nunca fosse tocada.
Lucien saiu do elevador tremendo, com os olhos vermelhos e o coração apertado. Não sabia o que faria dali em diante, tinha medo, medo de ficar sozinha com um filho para criar. Medo de não conseguir suportar a barra pela qual passaria. Mas tentava mais do que tudo ser forte. Teria que ser o mais forte que pudesse agora.
Passou a mão pela barriga. Não se via nada ainda, estava com apenas três semanas de gravidez. Mas acalmou-se apenas acariciando o bebê que cresceria ali. Acariciando seu filho, filho de um pai mentiroso. Mas seu filho.
A chuva parara, e Lucien saiu do edificio sem dar adeus ao porteiro, que a olhava de longe como se ja soubesse de tudo. Ela não o culpava, mas nao deixava de sentir raiva quando pensou que ele poderia tê-la avisado, ao menos. Ela talvez não tivesse que passar pela vergonha de olhar na cara dele. Mas isso agora era passado, e ela tinha muito com o que se preocupar enquanto uma vida crescia ali.
Andou alguns quarteirões, sem pensar muito bem onde estava indo, e passou na frente de um centro médico de ultrassonografia. Entrou. Precisava marcar uma, para ver se tudo estava bem e se acostumar com essa nova fase de mamãe.
Era uma clinica enorme, especializada em ultrassonografia de Gravidez, arejada e muito bem decorada. As pessoas andavam depressa ali dentro, e Lucien viu duas gravidas lendo uma revista. Não pode deixar de sorrir ao ver o barrigão de uma delas. Era uma mulher jovem e morena, usava uma bata e mostrava o ventre com satisfação. Lucien não podia esperar para ter uma barriga para mostrar. Mostrar que era forte. Que aguentaria isso e seria muito feliz com seu filho, ou filha.
A atendente a chamou. Sorria calorosamente.
-Bom dia, em que posso ajuda-la?
-Bom dia - Lucien começou - Eu gostaria de marcar uma ultrassonografia. - Terminou, com um sorriso.
-Claro. Sua primeira?
-Sim.
-Esta com quantas semanas de gestação?
-Três - Lucien sorriu confiante.
-A ultrassonografia sera acompanhada?
-Ahn.... - Lucin hesitou. Acompanhada por quem? Pelo pai? Não, ele era troglodita demais para isso - não. Desacompanhada.
-Tudo bem. Os horarios estão quase todos lotados, mas daqui a três dias poderemos atendê-la, às dezesseis horas.
-Otimo, quinta-feira as dezesseis horas. Estarei aqui.
-Forma de pagamento?
-Dinheiro.
-Otimo. A ultrassonografia simples, a que as gestantes fazem nos primeiros meses de gravidez, custa cento e trinta e dois euros.
-Otimo - Lucien começou a pensar seriamente o quanto custava caro ter um filho - Posso pagar no dia?
-Claro.
-Então ta, muito obrigada.
-Eu que lhe agradeço. Quinta-feira, as dezesseis horas estaremos prontos para atendê-la.
-Obrigada, até logo.
Saiu da clinica escandalizada com o preço da ultrassonografia, mas mesmo assim feliz por poder fazê-la logo. Não pediria um centavo ao pai da criança. Sabia que ele estava no direito de acompanhar a gestação, que era seu dever ajudar nas despesas, mas ela não tinha a minima vontade de manter contato com ele agora. Talvez depois, quando estivesse mais calma. Mas agora, tudo que passava na sua cabeça era ela e a criança. Não queria pensar em Lucca.
Lucien trabalhava desde os dezesseis anos por escolha propria. Nunca precisara, a familia tinha boas condições. Moravam em uma casa grande num bairro nobre. Mas, de qualquer maneira, nunca gostara de pedir dinheiro à mãe, então começou a trabalhar cedo para ficar independente cedo. Ganhava um dinheiro legal dando aulas particulares de inglês. Sabia que so com aquilo, ela e o filho talvez passassem necessidade, mas conseguiriam se virar.
Tinha algum dinheiro guardado, e continuaria trabalhando até que nã pudesse mais. Respirou profundamente, mais tranquila. Tudo iria se ajeitar, tudo daria certo no final.
Longe dali, uma sirene começou a tocar alto e constante, apavorando homens e mulheres em questão de segundos. Uma sirene maldita, que todos esperavam que nunca fosse tocada.
°°°°°
Todos começaram a se movimentar rapido, em todas as direções. Atordoados, procuravam saber o que acontecera, queriam nao acreditar no que escutaram, mas o desespero era geral e tomara conta de St. Ursus. Seguranças corriam com as armas apontadas, mulheres bem vestidas com ar de importância procuravam respostas. Era evidente.
Houvera uma fuga.
Quando a voz do diretor ecoou no patio, salas e corredores, todos congelaram.
Todos começaram a se movimentar rapido, em todas as direções. Atordoados, procuravam saber o que acontecera, queriam nao acreditar no que escutaram, mas o desespero era geral e tomara conta de St. Ursus. Seguranças corriam com as armas apontadas, mulheres bem vestidas com ar de importância procuravam respostas. Era evidente.
Houvera uma fuga.
Quando a voz do diretor ecoou no patio, salas e corredores, todos congelaram.
Com sua voz ressonante, o principal de St; Ursus anunciava a todos que Carls Lomann fugira. Ao escutar a sirene, os policiais e seguranças começaram a se movimentar como loucos, para todos os lados, rapida e organizadamente. O treinamento para o caso de fugas era constante, mas esta era a primeira fuga presenciada ali.
A sirene fora desativada. Em oito minutos, toda a prisão fora revistada pelos milhares de seguranças ali. Nenhum traço, nada. Dentro das poucas celas, os prisioneiros riam. Orgulhavam-se do companheiro que pudera fugir.
Nas salas e escritorios, o clima era tenso. As mulheres tremiam de medo, esforçando-se inutilmente para não demosntrar, e o os diretores e principais andavam de um lado para o outro abestalhados, sem saber o que acontecera, sem entender nada.
Os guardas, em questão de minutos, revistaram todas as celas, procurando algum indicio de uma proxima fuga, mas não encontraram nada.
Ninguém entendia. A segurança de uma das prisões mais importantes do pais acabara de ser burlada. Era impossivel.
St. Ursus não era uma penitenciaria qualquer. Era um Centro de Reabilitação para Criminosos Super Dotados. Era, resumindo, uma prisão para homens muito inteligentes. Criminosos que teriam tido vida prospera em muitas grandes empresas, mas acabaram entrando para o mundo dos crimes. Porém, a razão para os mesmos era quase sempre banal. Não eram, como especulavam os moradores, ladrões de milhões de bancos, assassinos de presidentes. Eram homens que vingaram alguma coisa, geralmente morte de entes queridos, de uma maneira tão cruel e bem elaborada que acabaram parando ali.
Ox Gorgue era um deles. Estava na prisão ha três anos, e ali ficaria por muito tempo ainda, segundo o juiz. Fora preso pelo assassinato de quatorze homens em uma floresta. Os homens que ela mais odiara na sua vida: os assassinos de sua mãe.
Aos dezesseis anos, Ox, como muitos de seus amigos, acabou entrando para o mundo das drogas. Era um garoto pobre, de origem humilde, criado por sua mãe. O pai fugira quando soube da gravidez, e Ox nunca o vira. A mãe, servente de um restaurante, sempre batalhara muito para criar o filho com dignidade, mas Ox não dera valor.
Entrara no mundo das drogas, das noites interminaveis. Fizera sua mãe sofrer, roubara dinheiro e fugia de casa, passando fins de semanas longe, desesperando sua mãe. Mas era de origem pobre, e o dinheiro para as drogas acabou em pouco tempo. Começou a dever os traficantes e não conseguia paga-los de nenhuma maneira. Vieram as ameaças, os telefonemas.
Um dia, Ox chegou em casa depois de uma noite um uma boate do bairro, e encontrou sua mãe caida no chão. Morta.
Fora estuprada, esfaqueada e deixada no chão limpo da cozinha sangrando até a morte. Aquilo foi o fim para Ox. Estava revoltado, um animal feroz acordou dentro dele e queria matar e fazer sofrer quem fizera aquilo com sua mãe.
Passara três anos planejando, cuidadosamente, a morte dos quinze homens que fizeram aquilo. Um acabou morrendo antes, em uma batalha entre traficantes rivais.
Juntou um bom dinheiro em uma empresa de informatica. Usou toda sua inteligência durante esse tempo para conseguir o maximo de dinheiro e contatos possiveis.
E foi o que fez. E em uma noite de outubro, em uma das florestas do Norte, assassinara a sangue frio todos os quatorze. Atraira-os simulando uma rivalidade entre os traficantes. Para tanto, tivera que andar com drogados e assassinos durante algum tempo.
Mas conseguira. Se vingara. Apos o assassinato, sentara no meio dos corpos, se sentindo aliviado. Acalmara a fera dentro dele. Eles tiveram o que mereciam.
Mas Ox não olhou para frente, não pensou no que seria depois. E se encontrava agora naquela prisão fria e solitaria, escutando a multidão la fora inquieta, e sentindo um sopro de animação ao saber da fuga de um dos encarcerados. Sentia vontade de sair dali também. Mas, o que esperaria do mundo la fora? Aos vinte e três anos, com a ficha suja, inimigos poderosos e assassinos. Preferia ficar por ali, as lembranças que tinha fora de St. Ursus nunca foram mais agradaveis do que as que tinha ali dentro. E ali, ao menos, ele tinha Lilian.
°°°°°
Elizabeth Ness rondava sua mesa de mogno com a cabecheia de pensamentos. Não conseguia acreditar que alguém consegiura escapar dali com tanta segurança. Policiais, cercas elétricas, câmeras, e o prisioneiro escapara sem a menor dificuldade. As câmeras de segurança estavam no momento sendo examinadas, e Elizabeth receberia logo um relatorio conclusivo. Mas nenhum policial o via partir. Ninguém tinha informações, muitas das pessoas pareciam simplesmente nem se importar, como se fosse algo que acontecia todos os dias e com o que não fosse importante se procupar. Ela não conseguira engolir toda aquela historia, percebia que faltava algo. Como figura importante na prisão, ela se sentia fracassada. Sabia que em questão de minutos a imprensa cairi em cima e Elizabeth não teria muito o que dizer. Ela fazia parte da coordenação de uma das mais seguras penitenciarias do pais, e via o reconhecimento e a segurança das pessoas escorrer entre seus dedos sem que pudesse detê-los.
Contudo, tinha muita confiança na mobilização das pessoas, e sentia que logo o prisioneiro estaria de volta confinado, mas mesmo assim a sensação de vazio, de frustração era maior do que ela. Seus colegas de tabalho estavam na mesma situação, procurando a solução de uma coisa que, algumas horas antes, todos consideravam impossivel.
Sentou-se na cadeira amarronzada com estofado de veludo e começou a ler os papéis que deveria assinar, parando algumas vezes para beber um gole d'agua. Olhava para as paredes com quadros, reportagens naquelas molduras, historias de sucesso. Fotose em preto e branco de acordos. Confiança na prisão.
Estava conferindo a lista de visitantes dos prisioneiros, e parou com atenção na de Carls Lomman. Ele recebera duas visitas esse mês. Uma de sua mulher, e outra de Agathe Morran.
Isso não era normal.
Nesse minuto, Lilian Herz entrou, um braço carregado de papéis e com o outro fechava a porta.Tinha o ar livido de raiva e bufava. Lilian era uma mulher bonita, nova, branca com os cabelos pretos. Era uma das resposanveis pelas consultas psicologicas dali. Hoje ela se ocupara de Ox Gorgue.
Lilian estava irritadissima. Se sentou a frente de Elizabeth, colocou os papéis sobre a mesa e começou a falar:
-Isso é realmente um grande absurdo. Essa Agathe, que ela pensa que é? Eu fico impressionada, chegou a menos de uma mês e age como se fosse dona do lugar! - respirou
-A novata... Também não sou muito fã dela, mas nunca vi falhas no seu trabalho, não ha muita coisa que eu possa dizer. A não ser que o comportamento dela as vezes é muito estranho - Elizabeth olhou o teto, com a cabeça longe. Lilian percebeu.
-Eu imagino como deve ser duro pra você, El, eu imagino. Mas não é culpa sua, realmente não é. Sua segurança sempre foi perfeita, você sempre se empenhou demais. Tem alguma coisa errada - alguma coisa que saiu fora de controle-. E acho que você deveria prestar mais atenção em Morran. Como você falou, ela tem um comportamento muito estranho, as vezes até um pouco suspeito, se é que você me entende. Hoje, tive que voltar a cela de Gorgue, para completar uma outra ficha. Ao sair dali, ela estava aos cochichos com dois guardas, e parou assim que me viu. E ela chegou ha pouco tempo e olha o que aconteceu! Não que isso seja pessoal, mas ha algo muito estranho com ela.
-Talvez você tenha razão - a pouca cor de Elizabeth parecia estar voltando - mas ela não pode ter feito algo assim debaixo dos nossos narizes. Talvez seja apenas um problema entre vocês, não?
Mas Elizabeth entendeu o que Lilian queria dizer. Era realmente muito estranho o comportamento de Agathe Morran. Aqueles corredores eram proibidos até para Elizabeth. Apenas os guardas e os psicologos tinham o direito de estarem la, e Agathe não se encaixava ai. Como ela não tinha a minima idéia do que estava acontecendo, o comportamento suspeito de Agathe era um bom lugar para começar.
-Nunca gostei desses enviados do governo - Lilian comentou, interrompendo os devaneios de Elizabeth. Sempre causam problemas, são estupidos e nunca ajudam. Não servem para absolutamente nada.
Elizabeth interrompeu:
-Onde ela estava quando você a viu?
-No corredor Douze, conversando com dois guardas. Mas saiu de la antes de mim, então presumo que deva procura-la em outro lugar. Na sala dela, talvez ?
-Talvez. Vou ter que te deixar. Pode ficar ai, sinta-se em casa - Elizabeth sorriu - vou perguntar a ela algumas coisinhas.
-Ok, divirta-se, estarei por aqui.
-Otimo. Atenda meu telefone, se isso for muito necessario, e cuidado com aqueles papeis.
-Pode deixar.
Elizabeth tomou seu ultimo gole de agua, levantou da cadeira e contornou a mesa.
-El - chamou Lilian - você me parece preocupada demais. Agathe aprontou algo que eu não saiba?
-Na mosca - Elizabeth concordou - Recebi o relatorio de visitas aos prisioneiros, e Carls Lomman teve uma sessão se visita com ela ha três dias. Isso realmente não é normal, e juntando com a conversa dela com os guardas, eu sou forçada a concluir que ela esta sabendo um pouco a mais que a gente. E é isso que eu vou fazer, Lilian. Vou agora a sala dela perguntar o que é isso. Com um pouco de sorte, ela vai ter que me dizer.
-Sorte... - Lilian ja não estava mais prestando atenção.
Elizabeth saiu da sala, sentindo o calor do corredor. Estava sempre congelando nas salas, devido a potencia do ar condicionado central.
St. Ursus era uma prisão fria, mas de qualquer maneira era um tanto bonita. Suas paredes de pedra, contrastando com algumas partes brancas, lembravam um convento, as vezes um hospital. Via-se quadros por todos os lados, bancos e placas. Não era muito convidativa, o unica jardim ficavca bem longe da sala de Elizabeth.
Cada prisioneiro ali tinha sua cela, que poderiamos com facilidade chamar de pequeno apartamento. Não havia contato entre eles, por menos que fosse, e eles so saiam de suas salas para as refeiçoes e para os horarios de exercicios. A vida social limitava-se as trocas de palavras rudes com os guardas e as curtas sessoes de atendimento psicologico, uma vez por semana. Muitos prisioneiros enlouqueciam. Outros buscavam abrigo na musica, ou nos livros.
Elizabeth parou em frente a uma porta preta. O nome Morran estava marcado em letras garrafais. Bateu com os punhos fechados. Três vezes.
Veio de dentro uma voz arrastada e um tanto quanto abafada, ordenando que entrasse. Elizabeth abriu a porta.
Agathe Morran parecia ja esperar sua visita. As duas se olharam durante alguns segundos, até Agathe quebrar o silêncio:
-Em que posso ajudar? - Estava no fundo da sala, e desligara o telefone assim que escutara Elizabeth bater. Encarava a visita com olhos fuzilantes. Elizabeth não se intimidou. Sentou na cadeira em frente a mesa, sem convite. Colocous os papéis ali. Notou que a mesa também era de mogno, como a sua.
-Apenas uma explicação plausivel para você ter visitado Lohmann ha três dias e para você ter conversas secretas com os guardas, isso vai me satisfazer por enquanto - sublinhou a palavra por enquanto.
Agathe ficou branca, mas quase instantaneamente recuperou a cor e a pose.
-Você não estaria me ameaçando, estaria?
-Sabe, Morran, em tempos tão suspeitos, é perigoso uma novata perambular por ai, cochichar com guardas onde não poderia estar e visitar prisioneiros sem autorização.
-Não me pareceu nada perigosos escutar as lorotas de Carls Lohmann, nem de convencer os dois guardas a não gritarem no corredor. O que eu posso fazer se um prisioneiro perturbado solicitou minha visita?
Agathe mentia bem, mas estava sendo um pouco obvia demais.
-Desculpe, a solicitação foi assinada por você. Invente uma desculpa melhor, tenho o tempo todo.
-Você esta me acusando de mentir? - Seus olhos ficaram estreitos, mas ela forçou uma voz doce - você sabe que eu estou tão preocupada quanto você por essa fuga. Não teria nenhuma razão para atrapalhar ou esconder.
-Disso eu não teria tanta certeza. O que significa essa visita? Você sabe que receberei amanhã os relatorios de todas as conversas que tenham envolvido Carls Lohmann ou algo assim. Eu saberei se você estiver mentindo, e você vai estar em um grande problema. O que você queria com essa visita?
Como ha cinco minutos atras, a cor de Agathe se esvaiu. Completamente. Ela esquecera os relatorios de videos.
-Saia da minha sala, tenho muito trabalho a fazer. Saia daqui!
-Você não me parece tão disposta a ajudar agora, Morran. Onde esta a conversa de que você também esta ao meu lado?
Um sino tocou longe. Seis horas da tarde. Em pouco tempo, Elizabeth estaria indo para casa, descansar a cabeça e pensar um pouco.
-Você quem sabe. Amanhã nos saberemos, enfim, o que você tanto queria com Carls Lohmann.
Elizabeth saiu do escritorio batendo a porta com força. Sentia que Agathe não sabia um pouco, mais muito mais que todos ali.
Dentro da sala, Agathe pegou o telefone, ainda livida. Discou o numero que desejava e esperou. A resposta veio logo. Ela apertou os labios contra o bocal.
-Ela sabe.
°°°°°
Lucien estava sentada no sofa de seu quarto, abraçando o joelho, em posição fetal, escutando o vento que batia na janela e a chuva, mais fraca. Tremia.
Não conseguia imaginar a reação de sua mãe. Ela estaria chegando em poucas horas, talvez em minutos, e ela ainda não pensara o que dizer, como dizer e o que fazer. Estava bloqueada. Se sentia de cabeça para baixo. Estava em duvida entre contar agora ou esperar a ultrassom. Estava apenas de cinco semanas, ninguém poderia desconfiar. O unico vestigios eram os enjôos, vertigens e cansaço, mas isso ela sabia que conseguiria esconder bem.
A partir dali, sua vida mudaria. Disso ela tinha certeza. O fato de não querer mais olhar na cara do pai da criança, mesmo que ele estivesse do lado dela, oficialmente, era cortante. Mas ela superaria. Não pretendia pedir dinheiro a ninguém. Era sua resposabilidade. A vida que crescia dentro dela era sua resposabilidade, e apesar do futuro parecer tão nublado, o sol acabaria saindo, ela tinha certeza.
A posição desfavoravel não atrapalhou seu sono. Estava quase cochilando quando o celular vibrou. Era uma mensagem.
Querida, vou ao mercado com Lilian. Volto as oito. Te amo.
Era sua mãe. Ela sorriu aliviada, queria ficar um pouco sozinha.
Sentiu as palpebras pesarem, e o sono acabou vencendo-a.
Sempre sonhava quando dormia, e dessa vez não foi diferente. Via um bebê, um garotinho. Era pequeno, talvez menos de um mês. Mas era a coisa mais linda que ja vira em sua vida. Poderia olhar para ele durante horas sem se cansar. Era perfeito, e sorria. Estava deitado ao lado dela em uma cama. Lucien olhou para o quarto, e ele era estranhamente familiar. Passou a mão em seu bebê, e ele segurou um de seus dedos. Era lindo demais, e o coração dela parecia prestes a explodir de felicidade. Então alguém a abraçou por tras, e ela sorriu. Escutou ua voz desconhecida sussurrar: "Eu te amo", e abraça-la por tras. O bebezinho olhava fixamente para Lucien, e ria. Ela se sentia protegida. O homem atras dela, quem quer que fosse, deixava relaxada. Ele afagou seus cabelos, e a beijou. Lucien abriu os olhos para contempla-lo, mas ao olhar para seu rosto, a imagem ficou borrada, como se estivesse deibaixo d'agua, e acabou por desaparecer.
Começou a escutar chamarem seu nome. Tentava responder, em vão. Demorou alguns longos segundos para perceber que a voz era de seu irmão, e que ela não estava mais dormindo.
-Bela Adormecida, seu namorado esta ai na porta querendo falar com você. Ele me deu cinco pratinhas para deixa-lo subir, e como eu sei que você ama seu namorado, ele esta esperando aqui fora. Posso pedi-lo para entrar?
Greg tinha um biscoito na boca e um copo de leite na mão. Provalvemente estava com fome, e Lucien esquecera completamente de preparar o jantar.
-Mande ele ir lamber sabão ! -Lucien virou para o outro lado, colocando o travesseiro em cima da orelha.
Escutou os passos de Greg ficando mais baixo, mas logo voltaram. Sabia que Lucca não iria desisitir.
-Ele disse que não saira da porta até você falar com ele. E eu estou com fome, sera que você poderia resolver seu problema com ele na cozinha, preparando o jantar?
-Seu pentelho mercenario. Ja passou da idade de aprender a cozinhar - mas riu, e levantou. Não tinha a minima vontade de falar com Lucca. Provavelmente iria ignora-lo, ou coisa assim.
Sabia que ele tinha direito de acompanhar a gravidez, mas estava com tanto nojo dele pelo episodio que acontecera mais cedo que estava pouco se importando com os direitos dele. Queria que ele desaparecesse da sua vida, o mais rapido possivel.
Ouviu passos na porta do quarto e sabia a quem eles pertenciam. Propositalmente, Lucien estava virada de costas para a entrada do quarto, fingindo arrumar alguma coisa. Quando não havia maia nada que ela pudesse fingir arrumar, ela virou de frente para Lucca.
Ele não sorria, e isso não era um bom sinal. Tinha o olhar longe,e parecia tão indiferente que isso cortou Lucien mais uma vez. Sentou na cadeira e olhou para ela, o olhar ainda não estava ali. Remexeu no bolso, e finalmente falou:
-Nos não poderemos ter essa criança, Lu.
Ela olhou incredula. Pela reação que ele tivera mais cedo, esperava que ele ao menos estivesse feliz com a gravidez.
-O que você pensa que quer dizer com "nos"?-Ela desafiou.
-Eu e você. Estou de mudança para a Australia, acabei de receber o telefonema daquela escola, eles me aceitaram. Vou para la em duas semanas. Mas eu ja providenciei tudo, não se preocupe. Trouxe os remedios, e se você quiser, posso ficar com você durante tudo.
Mais uma vez, Lucien sentiu que seu corpo se despedaçava. Mas dessa vez era pior, muito pior. Sentia odio de Lucca pela traição, mas nunca realmente considerara ficar longe dele durante essa gravidez.
E isso não era o pior. Ele sugerira um aborto. Era o que mais machucava Lucien, e ela não entendia. Ele queria esse bebê, ele estava feliz com isso.
-Espero que você esteja brincando, de verdade.
-Não Lu. Voce esta com três semanas, fique calma. E seguro abortar, muito seguro.
-EU NÃO SOU UMA ASSASSINA! - Ela deu as costas para ele, com o coração cada vez mais despedaçado - eu também não sou covarde.
-Não é questão de covardia, você não entende? Eu so tenho vinte e dois anos, um futuro pela frente. Você sabe o quanto eu gostaria de ter um filho, talvez as coisas pudessem ser mais faceis se eu nao estivesse me mudando, mas agora isso não é uma possibilidade viavel - ele estava ficando vermelho.
-Como você pode vir aqui, na minha casa, discutir sobre possibilidades viaveis? - a incredualidade era maior do que ela - Você dorme com uma outra mulher, você nega um filho seu, você vai me deixar gravida sozinha aqui, e você ainda quer discutir sobre possibilidades? Eu tenho dezoito anos, se por acaso você não percebeu, MAS EU VOU TER ESSE FILHO!
Va para sua escola estupida na Australia, fique por la. Aproveite e engravide uma australiana e dê esses remedios para ela, eu não quero isso. Eu nunca, nunca, faria mal ao mue filho, meu bebê! Você é nojento!
Ela saiu do quarto batendo a porta, tremendo dos pés a cabeça. Se sentia mal, enjoada, triste, com dor, sensivel, e com muita raiva. Passou pela sala onde o irmão estava, usando o computador em um volume tão alto que com ceteza não escutara a briga. Ela foi a cozinha, e abriu a porta. Lucca apareceu segundos depois, de cabeça baixa. Ela indicava a saida: queria que ele saisse dali e nunca mais voltasse. Não era aquele o Lucca que ela conhecera. O Lucca, pai de seu filho, era doce, e estaria ao lado dela. Esse homem parado em sua cozinha a traira, recusava o bebê e estava indo embora. Ela nunca se sentia tão sozinha, mas não queria demonstrar isso.
Ela segurava a porta para ele sair. Lucca hesitou, mas depois saiu sem se despedir. Pegara o remédio em cima da mesa: sabia que Lucien nunca cogitaria essa hipotese, ela nunca tiraria a criança.
Lucca não estava feliz com essa historia. Sempre quisera um filho, e no começo sua reação fora positiva. Mas com a aceitação na escola australiana, ele foi forçado a pensar melhor e perceber que não era aquilo que teria para sua vida. Não agora. Não poderia forçar Lucien a abortar, mas não assumiria a criança.
Ela fechou a porta e sentou em uma das cadeiras. Fechou os olhos e respirou. Ja sabia para onde iria.
Sua vo, ao morrer, deixou uma casa e uma herança para Lucien. Era uma casa em St. Omerez, pequena e mobiliada. Ia para la com a mãe, as vezes. Não pretendia morar com a mãe, mas sabia que também não seria facil cuidar de um bebê sozinha.
A herança, ao fazer dezoito anos, Lucien ganhou o direito de usa-la. Mas nunca precisou, e agora agradecia a vo por ter feito isso por ela. Era uma quantidade razoavel de dinheiro, suficiente para viver durante algum tempo.
Levantou para preparar a comida. A vida mudaria a partir dali. Mas estava preparada.
Ou pelo menos, parecia estar.
°°°°°
Elizabeth Ness rondava sua mesa de mogno com a cabecheia de pensamentos. Não conseguia acreditar que alguém consegiura escapar dali com tanta segurança. Policiais, cercas elétricas, câmeras, e o prisioneiro escapara sem a menor dificuldade. As câmeras de segurança estavam no momento sendo examinadas, e Elizabeth receberia logo um relatorio conclusivo. Mas nenhum policial o via partir. Ninguém tinha informações, muitas das pessoas pareciam simplesmente nem se importar, como se fosse algo que acontecia todos os dias e com o que não fosse importante se procupar. Ela não conseguira engolir toda aquela historia, percebia que faltava algo. Como figura importante na prisão, ela se sentia fracassada. Sabia que em questão de minutos a imprensa cairi em cima e Elizabeth não teria muito o que dizer. Ela fazia parte da coordenação de uma das mais seguras penitenciarias do pais, e via o reconhecimento e a segurança das pessoas escorrer entre seus dedos sem que pudesse detê-los.
Contudo, tinha muita confiança na mobilização das pessoas, e sentia que logo o prisioneiro estaria de volta confinado, mas mesmo assim a sensação de vazio, de frustração era maior do que ela. Seus colegas de tabalho estavam na mesma situação, procurando a solução de uma coisa que, algumas horas antes, todos consideravam impossivel.
Sentou-se na cadeira amarronzada com estofado de veludo e começou a ler os papéis que deveria assinar, parando algumas vezes para beber um gole d'agua. Olhava para as paredes com quadros, reportagens naquelas molduras, historias de sucesso. Fotose em preto e branco de acordos. Confiança na prisão.
Estava conferindo a lista de visitantes dos prisioneiros, e parou com atenção na de Carls Lomman. Ele recebera duas visitas esse mês. Uma de sua mulher, e outra de Agathe Morran.
Isso não era normal.
Nesse minuto, Lilian Herz entrou, um braço carregado de papéis e com o outro fechava a porta.Tinha o ar livido de raiva e bufava. Lilian era uma mulher bonita, nova, branca com os cabelos pretos. Era uma das resposanveis pelas consultas psicologicas dali. Hoje ela se ocupara de Ox Gorgue.
Lilian estava irritadissima. Se sentou a frente de Elizabeth, colocou os papéis sobre a mesa e começou a falar:
-Isso é realmente um grande absurdo. Essa Agathe, que ela pensa que é? Eu fico impressionada, chegou a menos de uma mês e age como se fosse dona do lugar! - respirou
-A novata... Também não sou muito fã dela, mas nunca vi falhas no seu trabalho, não ha muita coisa que eu possa dizer. A não ser que o comportamento dela as vezes é muito estranho - Elizabeth olhou o teto, com a cabeça longe. Lilian percebeu.
-Eu imagino como deve ser duro pra você, El, eu imagino. Mas não é culpa sua, realmente não é. Sua segurança sempre foi perfeita, você sempre se empenhou demais. Tem alguma coisa errada - alguma coisa que saiu fora de controle-. E acho que você deveria prestar mais atenção em Morran. Como você falou, ela tem um comportamento muito estranho, as vezes até um pouco suspeito, se é que você me entende. Hoje, tive que voltar a cela de Gorgue, para completar uma outra ficha. Ao sair dali, ela estava aos cochichos com dois guardas, e parou assim que me viu. E ela chegou ha pouco tempo e olha o que aconteceu! Não que isso seja pessoal, mas ha algo muito estranho com ela.
-Talvez você tenha razão - a pouca cor de Elizabeth parecia estar voltando - mas ela não pode ter feito algo assim debaixo dos nossos narizes. Talvez seja apenas um problema entre vocês, não?
Mas Elizabeth entendeu o que Lilian queria dizer. Era realmente muito estranho o comportamento de Agathe Morran. Aqueles corredores eram proibidos até para Elizabeth. Apenas os guardas e os psicologos tinham o direito de estarem la, e Agathe não se encaixava ai. Como ela não tinha a minima idéia do que estava acontecendo, o comportamento suspeito de Agathe era um bom lugar para começar.
-Nunca gostei desses enviados do governo - Lilian comentou, interrompendo os devaneios de Elizabeth. Sempre causam problemas, são estupidos e nunca ajudam. Não servem para absolutamente nada.
Elizabeth interrompeu:
-Onde ela estava quando você a viu?
-No corredor Douze, conversando com dois guardas. Mas saiu de la antes de mim, então presumo que deva procura-la em outro lugar. Na sala dela, talvez ?
-Talvez. Vou ter que te deixar. Pode ficar ai, sinta-se em casa - Elizabeth sorriu - vou perguntar a ela algumas coisinhas.
-Ok, divirta-se, estarei por aqui.
-Otimo. Atenda meu telefone, se isso for muito necessario, e cuidado com aqueles papeis.
-Pode deixar.
Elizabeth tomou seu ultimo gole de agua, levantou da cadeira e contornou a mesa.
-El - chamou Lilian - você me parece preocupada demais. Agathe aprontou algo que eu não saiba?
-Na mosca - Elizabeth concordou - Recebi o relatorio de visitas aos prisioneiros, e Carls Lomman teve uma sessão se visita com ela ha três dias. Isso realmente não é normal, e juntando com a conversa dela com os guardas, eu sou forçada a concluir que ela esta sabendo um pouco a mais que a gente. E é isso que eu vou fazer, Lilian. Vou agora a sala dela perguntar o que é isso. Com um pouco de sorte, ela vai ter que me dizer.
-Sorte... - Lilian ja não estava mais prestando atenção.
Elizabeth saiu da sala, sentindo o calor do corredor. Estava sempre congelando nas salas, devido a potencia do ar condicionado central.
St. Ursus era uma prisão fria, mas de qualquer maneira era um tanto bonita. Suas paredes de pedra, contrastando com algumas partes brancas, lembravam um convento, as vezes um hospital. Via-se quadros por todos os lados, bancos e placas. Não era muito convidativa, o unica jardim ficavca bem longe da sala de Elizabeth.
Cada prisioneiro ali tinha sua cela, que poderiamos com facilidade chamar de pequeno apartamento. Não havia contato entre eles, por menos que fosse, e eles so saiam de suas salas para as refeiçoes e para os horarios de exercicios. A vida social limitava-se as trocas de palavras rudes com os guardas e as curtas sessoes de atendimento psicologico, uma vez por semana. Muitos prisioneiros enlouqueciam. Outros buscavam abrigo na musica, ou nos livros.
Elizabeth parou em frente a uma porta preta. O nome Morran estava marcado em letras garrafais. Bateu com os punhos fechados. Três vezes.
Veio de dentro uma voz arrastada e um tanto quanto abafada, ordenando que entrasse. Elizabeth abriu a porta.
Agathe Morran parecia ja esperar sua visita. As duas se olharam durante alguns segundos, até Agathe quebrar o silêncio:
-Em que posso ajudar? - Estava no fundo da sala, e desligara o telefone assim que escutara Elizabeth bater. Encarava a visita com olhos fuzilantes. Elizabeth não se intimidou. Sentou na cadeira em frente a mesa, sem convite. Colocous os papéis ali. Notou que a mesa também era de mogno, como a sua.
-Apenas uma explicação plausivel para você ter visitado Lohmann ha três dias e para você ter conversas secretas com os guardas, isso vai me satisfazer por enquanto - sublinhou a palavra por enquanto.
Agathe ficou branca, mas quase instantaneamente recuperou a cor e a pose.
-Você não estaria me ameaçando, estaria?
-Sabe, Morran, em tempos tão suspeitos, é perigoso uma novata perambular por ai, cochichar com guardas onde não poderia estar e visitar prisioneiros sem autorização.
-Não me pareceu nada perigosos escutar as lorotas de Carls Lohmann, nem de convencer os dois guardas a não gritarem no corredor. O que eu posso fazer se um prisioneiro perturbado solicitou minha visita?
Agathe mentia bem, mas estava sendo um pouco obvia demais.
-Desculpe, a solicitação foi assinada por você. Invente uma desculpa melhor, tenho o tempo todo.
-Você esta me acusando de mentir? - Seus olhos ficaram estreitos, mas ela forçou uma voz doce - você sabe que eu estou tão preocupada quanto você por essa fuga. Não teria nenhuma razão para atrapalhar ou esconder.
-Disso eu não teria tanta certeza. O que significa essa visita? Você sabe que receberei amanhã os relatorios de todas as conversas que tenham envolvido Carls Lohmann ou algo assim. Eu saberei se você estiver mentindo, e você vai estar em um grande problema. O que você queria com essa visita?
Como ha cinco minutos atras, a cor de Agathe se esvaiu. Completamente. Ela esquecera os relatorios de videos.
-Saia da minha sala, tenho muito trabalho a fazer. Saia daqui!
-Você não me parece tão disposta a ajudar agora, Morran. Onde esta a conversa de que você também esta ao meu lado?
Um sino tocou longe. Seis horas da tarde. Em pouco tempo, Elizabeth estaria indo para casa, descansar a cabeça e pensar um pouco.
-Você quem sabe. Amanhã nos saberemos, enfim, o que você tanto queria com Carls Lohmann.
Elizabeth saiu do escritorio batendo a porta com força. Sentia que Agathe não sabia um pouco, mais muito mais que todos ali.
Dentro da sala, Agathe pegou o telefone, ainda livida. Discou o numero que desejava e esperou. A resposta veio logo. Ela apertou os labios contra o bocal.
-Ela sabe.
°°°°°
Lucien estava sentada no sofa de seu quarto, abraçando o joelho, em posição fetal, escutando o vento que batia na janela e a chuva, mais fraca. Tremia.
Não conseguia imaginar a reação de sua mãe. Ela estaria chegando em poucas horas, talvez em minutos, e ela ainda não pensara o que dizer, como dizer e o que fazer. Estava bloqueada. Se sentia de cabeça para baixo. Estava em duvida entre contar agora ou esperar a ultrassom. Estava apenas de cinco semanas, ninguém poderia desconfiar. O unico vestigios eram os enjôos, vertigens e cansaço, mas isso ela sabia que conseguiria esconder bem.
A partir dali, sua vida mudaria. Disso ela tinha certeza. O fato de não querer mais olhar na cara do pai da criança, mesmo que ele estivesse do lado dela, oficialmente, era cortante. Mas ela superaria. Não pretendia pedir dinheiro a ninguém. Era sua resposabilidade. A vida que crescia dentro dela era sua resposabilidade, e apesar do futuro parecer tão nublado, o sol acabaria saindo, ela tinha certeza.
A posição desfavoravel não atrapalhou seu sono. Estava quase cochilando quando o celular vibrou. Era uma mensagem.
Querida, vou ao mercado com Lilian. Volto as oito. Te amo.
Era sua mãe. Ela sorriu aliviada, queria ficar um pouco sozinha.
Sentiu as palpebras pesarem, e o sono acabou vencendo-a.
Sempre sonhava quando dormia, e dessa vez não foi diferente. Via um bebê, um garotinho. Era pequeno, talvez menos de um mês. Mas era a coisa mais linda que ja vira em sua vida. Poderia olhar para ele durante horas sem se cansar. Era perfeito, e sorria. Estava deitado ao lado dela em uma cama. Lucien olhou para o quarto, e ele era estranhamente familiar. Passou a mão em seu bebê, e ele segurou um de seus dedos. Era lindo demais, e o coração dela parecia prestes a explodir de felicidade. Então alguém a abraçou por tras, e ela sorriu. Escutou ua voz desconhecida sussurrar: "Eu te amo", e abraça-la por tras. O bebezinho olhava fixamente para Lucien, e ria. Ela se sentia protegida. O homem atras dela, quem quer que fosse, deixava relaxada. Ele afagou seus cabelos, e a beijou. Lucien abriu os olhos para contempla-lo, mas ao olhar para seu rosto, a imagem ficou borrada, como se estivesse deibaixo d'agua, e acabou por desaparecer.
Começou a escutar chamarem seu nome. Tentava responder, em vão. Demorou alguns longos segundos para perceber que a voz era de seu irmão, e que ela não estava mais dormindo.
-Bela Adormecida, seu namorado esta ai na porta querendo falar com você. Ele me deu cinco pratinhas para deixa-lo subir, e como eu sei que você ama seu namorado, ele esta esperando aqui fora. Posso pedi-lo para entrar?
Greg tinha um biscoito na boca e um copo de leite na mão. Provalvemente estava com fome, e Lucien esquecera completamente de preparar o jantar.
-Mande ele ir lamber sabão ! -Lucien virou para o outro lado, colocando o travesseiro em cima da orelha.
Escutou os passos de Greg ficando mais baixo, mas logo voltaram. Sabia que Lucca não iria desisitir.
-Ele disse que não saira da porta até você falar com ele. E eu estou com fome, sera que você poderia resolver seu problema com ele na cozinha, preparando o jantar?
-Seu pentelho mercenario. Ja passou da idade de aprender a cozinhar - mas riu, e levantou. Não tinha a minima vontade de falar com Lucca. Provavelmente iria ignora-lo, ou coisa assim.
Sabia que ele tinha direito de acompanhar a gravidez, mas estava com tanto nojo dele pelo episodio que acontecera mais cedo que estava pouco se importando com os direitos dele. Queria que ele desaparecesse da sua vida, o mais rapido possivel.
Ouviu passos na porta do quarto e sabia a quem eles pertenciam. Propositalmente, Lucien estava virada de costas para a entrada do quarto, fingindo arrumar alguma coisa. Quando não havia maia nada que ela pudesse fingir arrumar, ela virou de frente para Lucca.
Ele não sorria, e isso não era um bom sinal. Tinha o olhar longe,e parecia tão indiferente que isso cortou Lucien mais uma vez. Sentou na cadeira e olhou para ela, o olhar ainda não estava ali. Remexeu no bolso, e finalmente falou:
-Nos não poderemos ter essa criança, Lu.
Ela olhou incredula. Pela reação que ele tivera mais cedo, esperava que ele ao menos estivesse feliz com a gravidez.
-O que você pensa que quer dizer com "nos"?-Ela desafiou.
-Eu e você. Estou de mudança para a Australia, acabei de receber o telefonema daquela escola, eles me aceitaram. Vou para la em duas semanas. Mas eu ja providenciei tudo, não se preocupe. Trouxe os remedios, e se você quiser, posso ficar com você durante tudo.
Mais uma vez, Lucien sentiu que seu corpo se despedaçava. Mas dessa vez era pior, muito pior. Sentia odio de Lucca pela traição, mas nunca realmente considerara ficar longe dele durante essa gravidez.
E isso não era o pior. Ele sugerira um aborto. Era o que mais machucava Lucien, e ela não entendia. Ele queria esse bebê, ele estava feliz com isso.
-Espero que você esteja brincando, de verdade.
-Não Lu. Voce esta com três semanas, fique calma. E seguro abortar, muito seguro.
-EU NÃO SOU UMA ASSASSINA! - Ela deu as costas para ele, com o coração cada vez mais despedaçado - eu também não sou covarde.
-Não é questão de covardia, você não entende? Eu so tenho vinte e dois anos, um futuro pela frente. Você sabe o quanto eu gostaria de ter um filho, talvez as coisas pudessem ser mais faceis se eu nao estivesse me mudando, mas agora isso não é uma possibilidade viavel - ele estava ficando vermelho.
-Como você pode vir aqui, na minha casa, discutir sobre possibilidades viaveis? - a incredualidade era maior do que ela - Você dorme com uma outra mulher, você nega um filho seu, você vai me deixar gravida sozinha aqui, e você ainda quer discutir sobre possibilidades? Eu tenho dezoito anos, se por acaso você não percebeu, MAS EU VOU TER ESSE FILHO!
Va para sua escola estupida na Australia, fique por la. Aproveite e engravide uma australiana e dê esses remedios para ela, eu não quero isso. Eu nunca, nunca, faria mal ao mue filho, meu bebê! Você é nojento!
Ela saiu do quarto batendo a porta, tremendo dos pés a cabeça. Se sentia mal, enjoada, triste, com dor, sensivel, e com muita raiva. Passou pela sala onde o irmão estava, usando o computador em um volume tão alto que com ceteza não escutara a briga. Ela foi a cozinha, e abriu a porta. Lucca apareceu segundos depois, de cabeça baixa. Ela indicava a saida: queria que ele saisse dali e nunca mais voltasse. Não era aquele o Lucca que ela conhecera. O Lucca, pai de seu filho, era doce, e estaria ao lado dela. Esse homem parado em sua cozinha a traira, recusava o bebê e estava indo embora. Ela nunca se sentia tão sozinha, mas não queria demonstrar isso.
Ela segurava a porta para ele sair. Lucca hesitou, mas depois saiu sem se despedir. Pegara o remédio em cima da mesa: sabia que Lucien nunca cogitaria essa hipotese, ela nunca tiraria a criança.
Lucca não estava feliz com essa historia. Sempre quisera um filho, e no começo sua reação fora positiva. Mas com a aceitação na escola australiana, ele foi forçado a pensar melhor e perceber que não era aquilo que teria para sua vida. Não agora. Não poderia forçar Lucien a abortar, mas não assumiria a criança.
Ela fechou a porta e sentou em uma das cadeiras. Fechou os olhos e respirou. Ja sabia para onde iria.
Sua vo, ao morrer, deixou uma casa e uma herança para Lucien. Era uma casa em St. Omerez, pequena e mobiliada. Ia para la com a mãe, as vezes. Não pretendia morar com a mãe, mas sabia que também não seria facil cuidar de um bebê sozinha.
A herança, ao fazer dezoito anos, Lucien ganhou o direito de usa-la. Mas nunca precisou, e agora agradecia a vo por ter feito isso por ela. Era uma quantidade razoavel de dinheiro, suficiente para viver durante algum tempo.
Levantou para preparar a comida. A vida mudaria a partir dali. Mas estava preparada.
Ou pelo menos, parecia estar.
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